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“É preciso saber interpretar o oráculo”


Helena Martins, gestora de Políticas Públicas da Google para Portugal, Vítor Tomé, o moderador, representante da GILM da Universidade Autónoma de Lisboa, Lino Santos, diretor do Centro Nacional de Cibersegurança, e Miguel Crespo, coordenador da Iberifier.


As literacias mediática e digital são fundamentais para distinguir a verdade da mentira, na informação. Desinformação e Infodemias foram os temas principais de debate da II sessão plenária que teve palco na Escola Superior de Comunicação Social


Texto: Daniela Nunes, Maria Santiago, Marta Pinto e Rita Sousa

Foto: Leonardo Costa

A quantidade de informação a que estamos expostos atualmente é progressivamente mais elevada a cada dia que passa e a desinformação prolifera pela sociedade como uma epidemia. O Grupo Informal sobre Literacia Mediática (GILM), em parceria com a ESCS, realizou uma sessão plenária que teve como principais temas de debate o papel da literacia mediática na sociedade e como a desinformação pode gerar complicações.


A II sessão plenária do VI Congresso Literacia, Media e Cidadania, realizada no passado fim de semana, dias 21 e 22 de Abril, e moderada por Vítor Tomé, debateu temas como a importância do investimento na literacia mediática.


"A literacia mediática por si só não é uma solução para a desinformação”. Foi com estas palavras que o moderador Vítor Tomé, docente na Universidade Autónoma de Lisboa e membro do GILM, deu início à sessão sobre “Desinformação e Infodemias: o papel da Literacia Mediática”. O debate contou com a presença de quatro oradores: Helena Martins, gestora de Políticas Públicas da Google para Portugal; Lino Santos, diretor do Centro Nacional de Cibersegurança; Mário Figueiredo, professor do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa e Miguel Crespo, investigador do CIES-ISCTE e coordenador da Iberifier.


As portas do Auditório Vítor Macieira abriram-se a estudantes, jornalistas, docentes e investigadores nacionais e internacionais dos mais variados órgãos e institutos, que abordara temas como: cibersegurança, o cidadão, a desinformação, o papel dos jornalistas, entre outros.


O funcionamento do algoritmo


O funcionamento do algoritmo foi o primeiro ponto alvo de discussão, um tema bastante atual e frequentemente questionado nesta era digital em que vivemos. Interrogada pelo moderador, Helena Martins, com base na sua experiência na empresa Google, deu a conhecer aos congressistas presentes a realidade por detrás do conceito “algoritmo”. A oradora explicou que existem alguns elementos que são fundamentais para que um motor de busca, neste caso o Google, consiga entregar resultados que correspondam às necessidades dos indivíduos, entre eles: a localidade, a língua e o significado das palavras usadas na pesquisa. “A missão da Google é organizar toda a informação do mundo e torná-la útil”, afirmou a gestora de Políticas Públicas da Google, que acredita que para isso ser possível é fundamental haver uma fiscalização de sites que possam disseminar a desinformação.


O fact checking, os algoritmos e a desinformação


Após a introdução ao modo de funcionamento dos algoritmos da Google, o moderador da sessão questionou Miguel Crespo acerca da possibilidade de estes mesmos poderem ajudar no combate à disseminação da desinformação. O docente no ISCTE começou por referir a importância de realizar “um mapeamento dos media digitais, perceber que meios temos e o que é que as pessoas entendem por desinformação”.


Para Miguel Crespo, o fact checking é um aspeto fulcral para o combate à divulgação de informações pouco fiáveis ou mesmo falsas: “O fact checking tem aumentado cada vez mais, especialmente em tempos de crise”, afirmou. O professor de comunicação digital explicou que é em tempos de crise que o fact checking tem um papel ainda mais ativo no combate à desinformação, pois é nesses contextos que há um crescimento exponencial das designadas infodemias. Como coordenador da Iberifier, o Observatório Ibérico de Meios Digitais e da Desinformação, Miguel Crespo sublinhou que “deve haver verificação prévia dos conteúdos para identificar desinformação” e, desta maneira, prosseguir-se à tentativa de construção de protótipos capazes de auxiliar na luta contra esse problema.


O impacto dos modelos de negócio


Levantada a questão de como a inteligência artificial cresceu a um nível tão rápido nos últimos tempos, o professor do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa, Mário Figueiredo, revelou o que está por detrás de toda esta rápida evolução. As redes sociais e os navegadores de busca que utilizamos no nosso dia a dia, nomeadamente o Google, têm um modelo de negócio por trás. Quer isto dizer que as empresas se baseiam num modelo de negócio cujos principais objetivos são a captação do maior número de utilizadores possível e o consequente lucro que daí advém. O mecanismo utilizado para alcançar estes objetivos passa pelo uso de ferramentas sofisticadas, uma vez que são capazes de atrair a atenção do público em geral. “Foi por aí que chegámos até aqui”, finalizou.


A intervenção do professor mostrou como a inteligência artificial e as tecnologias avançadas, como o deepfake, são capazes de gerar lucro e despertar tanto interesse nos seus utilizadores.


A cibersegurança


No que toca à cibersegurança, o coordenador do CNCS, Lino Santos, frisou a importância de priorizar a questão. As razões que justificam os incidentes ao nível da cibersegurança são conhecidas e englobam motivações financeiras, negociações de serviços, ou atos de “mero vandalismo”, afirmou. O setor dos media, detentor dos portais mais consumidos no que diz respeito à informação, é destacado como alvo e caracterizado por Lino como "extremamente apetecível”. Destacou na sua intervenção a urgência de uma maior preparação por parte das organizações relativamente à proteção da sua informação e ao plano de reação. “A aposta na literacia digital é importante”, acrescentou, quando constatou que em 53% dos casos de incidentes o fator explorado é o humano.


Quando mencionada a prevenção da desinformação, Lino Santos falou sobre a necessidade de criar uma cultura de consumo de informação digital consciente que permita ao cidadão distinguir o verdadeiro do falso. A promoção da educação do consumidor foi tema ao longo de todo o debate e o diretor do Centro Nacional de Cibersegurança não deixou de frisar a importância de o cidadão saber o que são fake news e de perceber quais os elementos que as identificam. “É necessário atuar ao lado do consumidor”, reforçou.



A interpretação dos “oráculos da verdade”


A certo ponto, Mário Figueiredo foi questionado sobre a possibilidade de estarmos a caminhar para um futuro onde as máquinas ocupam um papel de destaque nas nossas casas, ao que este respondeu: “Já fazemos isso!”. O professor do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa acredita que atualmente já dependemos muito da informação fornecida pela internet no nosso dia a dia, e disse ser um exemplo o fenómeno “doctor google”.


Desta forma, Mário Figueiredo referiu que “é preciso saber interpretar o oráculo” da internet e que essa é uma “skill avançada” hoje em dia, não só porque a maioria das pessoas não sabe pesquisar e interpretar a informação que recebe, mas também porque o “próprio oráculo está infetado”.



O papel dos jornalistas no combate à desinformação


O papel dos jornalistas e a aposta na sua formação são elementos fundamentais do combate à disseminação de fake news e desinformação. O moderador dirigiu uma questão relacionada com este tema a Miguel Crespo, que começou por referir que “os jornalistas são um grupo de pessoas aberto a aprender, a receber informação e a evoluir”. No entanto, por vezes, a função principal destes - fornecer informação de forma realista - acaba por ficar posta de parte.


“Quando o jornalismo para os cidadãos parece falhar, isso enfraquece o jornalismo e as sociedades”, disse. O jornalista fez questão de defender que muitos dos problemas de desinformação que ocorrem nos media “podiam ser resolvidos com 10 segundos de trabalho” e referiu exemplos como algumas capas falsas do jornal americano The New York Times.


Para terminar, referiu que as formações para jornalistas que estavam a ser postas em prática, em Portugal e nos países lusófonos, estavam a ter “muita adesão e os resultados [a ser] ótimos”.


Também as iniciativas e programas associados à literacia digital e à literacia dos media são tanto importantes, quanto precisos. A Google aposta nesse ramo “que se compromete a promover a literacia dos media e não a fazer a literacia dos media.” Helena Martins, gestora de Políticas Públicas da Google para Portugal, no decorrer da sessão referiu algumas das iniciativas levadas a cabo pela Google.


“Dá realmente o conhecimento de literacia digital a pessoas desempregadas. Demonstra também a questão da necessidade da literacia mediática ter de andar ao lado da literacia digital”, foi deste modo que Helena Martins fez referência à iniciativa em colaboração com a Sic Esperança, que tem como objetivo programar o futuro.


A oradora destacou o 1º projeto de literacia mediática da Google em parceria com entidades de publicidade em Portugal: o Media Veritas. Este projeto, da Associação Portuguesa de Imprensa, tem como objetivo a criação de workshops de pensamento crítico direcionados a alunos, professores, como também a jornalistas. Helena Martins citou também outros programas, destinados tanto a jovens, como à camada adulta e sénior da sociedade.

Para além de iniciativas que apostam na formação, existe uma vasta rede de projetos na área da investigação, como é o caso do Fundo Europeu de Literacia Mediática.


O receio do que vem aí


Um dos importantes temas debatidos ao longo da sessão foi a questão do “receio do futuro". Mário Figueiredo abordou o tema de uma perspetiva positiva e afirmou que “não há nada de novo”. Segundo o professor, as novas tecnologias que hoje nos chegam são melhoramentos e avanços daquilo que já existe.


Em relação com este tema, surgiu a questão da ditadura da tecnologia. Mário Figueiredo defende que parar com os avanços tecnológicos é um processo impraticável e que para que as coisas não saiam do controlo a solução está na regulamentação. “Qualquer coisa que afete a sociedade, tem de ser alvo de regulamentação”, disse. A tecnologia, atualmente, afeta bastante a nossa sociedade e por isso mesmo tem de haver um controlo e políticas que vão ao encontro daquilo que a sociedade necessita.


A autorregulação e a co-regulação das plataformas


Durante a discussão surgiu a oportunidade de ficarmos a perceber melhor de que maneira a Google, uma das plataformas mais abrangentes, regula a questão da desinformação. “A autorregulação é suficiente na estrutura da Google?” foi a pergunta que Vítor Tomé direcionou a Helena Martins. A oradora deixou claro que a existência do código da desinformação, desde 2018, e a sua fortificação proveniente do ato dos serviços digitais, já funciona como uma co-regulação.


Além disto, para grandes plataformas como a Google, existem certas obrigações a serem cumpridas. Uma dessas obrigações consiste numa avaliação de risco em relação ao funcionamento da plataforma na divulgação de conteúdo ilegal de ano a ano, o que deixa claro o caráter regulador do código sobre a empresa.


“Nós já estamos num modelo de co-regulação", afirma Helena Martins, que refere também que, do ponto de vista da Google, “a experiência de trabalhar com o código tem sido muito importante”, na medida em que ao longo dos anos este foi questionando as políticas vigentes e promovendo uma constante reavaliação das mesmas.


O debate terminou com um apelo à cidadania e à importância da literacia mediática no século em que vivemos, que se caracteriza por uma presença avassaladora das tecnologias, protagonizado pelo assessor da direção e coordenador de formação no Cenjor, Miguel Crespo. “A tecnologia permite avanços civilizacionais e, como tudo, tem os seus lados positivos e lados negativos”, começou por dizer. O impacto alargado da divulgação de informações falsas nos media foi posta em cima da mesa.


As espirais de fake news que se formam atualmente através dos media têm um grande impacto e “não ajudam ninguém”, defendeu o orador. O consultor editorial enunciou que “por definição, não existem meios desinformativos, mas sim fontes que podem, ou não, ter desinformação” e destacou a necessidade de regular esta situação, apesar de implicar tempo, esforço e dinheiro. Defende que “a solução final está do lado dos cidadãos e do seu espírito crítico” e passa pela necessidade de lhes dar as ferramentas necessárias.


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